quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Spleen

"Vejo-vos, pensamentos, alterados;
e não quereis, de esquivos, declarar-me
que é isto que vos traz tão enleados?
Não me negueis, se andais para negar-me;
que, se contra mim estais alevantados,
eu vos ajudarei mesmo a matar-me."
(Luís Vaz de Camões)


Há alguns meses atrás, eu diria que a desejava. No entanto, nesse momento, imploro de joelhos por Ela.

Eu estaria completando dois anos de namoro, exatamente dentro de um mês. É provável que eu estivesse me descabelando atrás do presente ideal. Ou não. Mas, com certeza, estariam fazendo isso em busca do meu. Talvez me desse um carro de controle remoto que sanaria a frustração de minha infância, quem sabe algum CD do Tom ou do Chico, quiçá um artigo erótico. Porém, o mais provável é que me presenteasse com algum tipo de artefato feito por suas próprias mãos, o que me deixaria ainda mais contente que as três possibilidades anteriores juntas. E a caixa, que ela própria também construiria, possivelmente seria enfeitada com um desenho de dois animais em situação romântica que nos representariam, ou, quem sabe, com fotos nossas.

Fotos. Devíamos ter tirado mais. Poucas são as que tenho guardadas. Algumas tiradas de surpresa, na verdade, muitas tiradas de surpresa, a grande maioria. Às vezes a via parada, como quem pensasse em algo tão fascinante que a tirava da realidade - gosto de pensar que eu fazia parte desses pensamentos - nessas horas, aproveitava as facilidades da tecnologia que portamos no bolso e não perdia a oportunidade de registrar aquilo. São assim quase todas as fotografias que tenho dela: sem que eu esteja ao lado. Não posso acreditar que tiramos tão poucas fotos juntos em quase dois anos.

Dois anos. Faria dois anos que a amo. Talvez não exatamente isso, talvez mais tempo, talvez menos, não saberia dizer ao certo quando o amor apareceu, se antes ou depois que a pedi em namoro dentro do cinema. Provavelmente depois, o amor vem com o tempo, quando você começa a admirar as qualidades e achar graça dos defeitos do outro. A paixão posso dizer que já existia, ela sim é capaz de aparecer do nada, como vemos nos filmes, ou como quando assistimos a algum e reparamos aquela que está sentada na nossa frente, e então já não sabemos o que se passa na tela, estamos construindo nosso próprio filme em nossa mente, ou de fato. Em contrapartida, essa paixão que nos toma do nada, evapora-se rápido, e, depois disto, só vai aparece de vez em quando, em uns picos de adrenalina que certos momentos nos despertam. O amor fica, às vezes escondido em algum canto que não sei onde, mas fica. Sendo que costuma tanto se esconder, que nos faz esquecê-lo vez ou outra, o que gera confusões. Acredito que o que vai definir se um casal vai ou não permanecer junto, é o quanto dura a paixão, pois ela precisa sobreviver tempo suficiente para que o amor brote, quando ele tem de brotar. Enfim, eu diria que me apaixonei há mais tempo que amo, mas permaneci (e permaneço) amando muito mais tempo que apaixonado. Talvez esse tenha sido um erro: desprezar a paixão. Ela é inferior ao amor, mas nem por isso deixa de ser necessária. O que sei é que agora os dois sentimentos me voltam com uma intensidade sufocante, mas parece ser tarde.

Dirá ela que foi melhor assim. Não concordo. Mas nada posso fazer pra mudar seu pensamento. Verdade que eram muitas as diferenças, nos desentendíamos constantemente, até chegar ao ponto em que a vida tornou-se um inferno, e só o que eu queria é que Ela viesse para por um fim nisto. O que, podem perceber, não foi feito.

Muitos concordariam que não tinha mesmo jeito de darmos certo, outros poderiam jurar por deus que nascemos um para o outro. Mas isso também não sei, e nunca poderemos saber. Na realidade, nunca sabemos de nada, só o que podemos ter certeza é do que achamos. E o que acho é que teríamos filhos lindos, uma bela casa desenhada por ela - mas com muitos pitacos meus - e uma vida cheia de altos e baixos, como são as vidas dos amantes, como sempre foi nossa vida. E achar isso me dói ainda mais.

No entanto, tudo me leva a crer que nunca terei confirmação de nada disso. Pois, a cada dia, mais anseio por Ela. E, em pouco tempo, serei capaz de trazê-la mesmo à força, se não vier atrás de mim.


"Poetas! amanhã ao meu cadáver
Minha tripa cortai mais sonorosa!...
Façam dela uma corda e cantem nela
Os amores da vida esperançosa!"
(Alvares de Azevedo)

2 comentários:

  1. Bela declaração de amor!

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  2. Muito bem...escrever o que a gente sente é muito legal, e fazer o que a gente sente também né?
    Só que cada coisa tem um preço, como sabemos.

    (Emília)

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